Natal sem Deus é um evento anual que já se encontra em sua décima edição. Promovido pela Spunk, o evento reúne bandas underground para uma tarde de mosh, bebedeira, som porrada e arrecadação de brinquedos para ações de caridade. A edição desse ano aconteceu num bar chamado Camaleão Cultural, que fica na rua São Francisco, centro do bairro homônimo. É uma das principais áreas do centro histórico de Curitiba, pontilhada por edifícios ecléticos do início do século XX e grandes prédios de características modernas, construídos lá pela década de 50 e 60. A rua São Francisco, em especial, por não se tratar de uma rua residencial, conta com uma quantidade significativa de bares, cafés e outros comércios alternativos, como brechós e barbearias.
Coisa de uns 10 anos atrás houve uma tentativa de gentrificação da rua, que a transformou em ponto de sociabilização para jovens brancos de classe média com a implementação de comércios caros. A iniciativa, além de ser por si só excludente em relação às populações negras e mais pobres que ocupam o centro histórico da cidade, foi frustrada pelo tráfico, que voltou a ditar como a rua poderia e deveria ser ocupada de dia e de noite. Os comércios caros buscaram áreas mais brancas da cidade para ocupar, e bares mais baratos seguiram funcionando ali, como é o caso do meu bar favorito da vida, o Dino.
O Dino é um bar relativamente recente, que deve ter uns 3 anos de funcionamento, e fica bem ao lado do Camaleão Cultural. É um boteco roots onde o litrão custa 16 reais, tem mesa de sinuca e pebolim e ninguém liga se vc fuma no andar de cima (o bar tem três andares!!). Já o Camaleão Cultural é um bar com estrutura pra shows e apresenta uma programação cultural variada com noites de funk, gótico, brasilidades, death metal, pagode, drag queens… só não tem o que vc não quer. Pra um lugar que opera como casa de shows, o espaço é bem pequeno e a ventilação não é muito boa, o que dá ao lugar uma atmosfera de inferninho que eu, particularmente, acho legal.
A abertura da casa estava programada para as 15h com o show da primeira banda, Badtrip, marcado para as 16h30. Cheguei na função às 17h e o show ainda não havia começado. A rua estava muito cheia, tinha muitos punks, uns emos com cara de ensino médio, uma galera glam metal (vi até uma pessoa usando camiseta do Cinderella KKKKK), uns hard rock de camiseta cropped e bigodão… muita gente mesmo! E, claro, os mesmos metaleiros velhos e cansados de sempre, dentre os quais incluo a mim mesma.
Fazia um calor abafado e a chuva ameaçava cair a qualquer momento. Quando choveu, as bandas estavam começando e o lugar ficou muito cheio. Não vi o show do Badtrip, deixei para entrar na segunda banda, o Cemitério. Cemitério é uma banda de thrash/death metal que canta em português e tem músicas com temáticas de filmes de horror. Foi um show divertido, e músicas como Massacre no Texas e Holocausto Canibal fizeram os mais jovens caírem no mosh. Foi engraçado quando a banda anunciou que haviam perdido uma gaita (!!!), um par de óculos e um fone de ouvido no meio do mosh. Tentei filmar, mas eu estava muito no fundo e o vídeo ficou péssimo. Foi minha primeira tentativa de vídeo com o celular novo, e até o final da noite tive algumas tentativas melhor sucedidas.
A terceira banda do lineup foi, na minha opinião, o destaque do evento. Espectro é uma banda curitibana de heavy metal tradicional com um pezinho no stoner rock: dois gêneros que eu não sou muito fã, mas beleza. Cara, que surpresa! Todos os instrumentos perfeitos, com destaque pra Karina do duo Cassandra na bateria, e um vocalista muito muito bom. Já fiquei ansiosa para vê-los tocar outra vez.
A quarta banda do lineup foi o Crotch Rot, banda de grindcore que está sempre por aqui. Já vi show deles algumas vezes e, como grind não é muito o meu rolê, acabei aproveitando pra sentar um pouco no Janaíno, bar vegano que fica em frente ao Camaleão, e fazer um lanche. Entre encontros e desencontros com o pessoal, fiquei por ali até a metade do show do Creatures. Quando entrei pra ver a banda entendi porque tinha tanta gente do hard rock e glam metal no meio da galera: era exatamente essa a vibe da banda. Solos infinitos de guitarra, vocal em falsetto, bigodes enormes, tudo com aquela vibe de início dos anos 80. É uma banda que eu jamais descobriria se o lineup do Natal sem Deus não fosse tão eclético.
Lá pelas 21h veio o show mais aguardado da noite, da banda Podridão. Podridão é uma banda de death metal do interior de São Paulo que tem sido aclamada como uma das melhores do gênero atualmente. De 2016 para cá, a banda teve uma prolífica discografia à qual fez jus o show de aproximadamente 1h de duração. A noite encerrou com a banda Cães de Terminal, mas àquela altura eu já estava bem cansada e preferi ficar conversando com o pessoal no segundo andar do bar, onde algumas rolavam algumas banquinhas de merch, e onde também expunham o brechó trevoso da Vitória e as artes macabras da FranHell.
Embora eu não tenha assistido todas as bandas, achei o evento bem organizado, sem filas de caixa, organizadores fáceis de identificar no meio da galera (eles usavam touca de papai noel), e informações claras e fáceis de acessar. Embora não tenha sido muito pontual em relação à programação divulgada pelo instagram, foi muito útil uma postagem que fizeram indicando a sequência e os horários em que tocariam as bandas. O que faltou foi lugar pra sentar e mais banheiros pra que não se formassem filas tão demoradas. Mas isso vai da estrutura do Camaleão e não da organização do evento. Acabei passando bastante tempo nos bares adjacentes pra poder sentar um pouco, comer, etc.
Eu não sei como a organização do Natal sem Deus faz a prestação de contas das doações arrecadadas, mas ficaria feliz em ver para onde serão doados os brinquedos e os valores em dinheiro.
Com esse relato do último evento de metal extremo do ano, despeço-me do Medium. O arquivo de crônicas publicadas aqui já foi transferido para o domínio curitibametal.com, plataforma a partir da qual serão publicados os próximos textos. No hiato de shows do mês de janeiro devo aproveitar pra me jogar muito nos blocos de carnaval, afinal, nem só de metal vive a mulher. Nesse ínterim também pretendo escrever sobre algumas outras coisas como filmes e lançamentos de discos, mas vamos ver como será o andamento do início de 2025.
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